Quatro histórias:
Doce Impakto, Rui Tovar, Raízes e Terra a Terra
Nesta crónica, o leitor encontra-se perante quatro temáticas à primeira vista bastante diferentes, que em comum, estavam perdidas no sótão da Caixa Idiota Instruída (vulgo cérebro).
Naquele início da quarta tarde de Julho, ultimando a narrativa ao sabor da infusão preparada com semente de cafezeiro, servida em chávena de vidro e sem adição de açúcar, no Doce Impakto – café/pastelaria sem vista para o mar, situado na Rua das Quintas, no concelho de Almada, onde a mistura simples da arquitectura decorativa com a ambiência pacata e a simpatia, convidam a colocar a leitura em dia, trazendo à memória um café similar que frequentava na vila algarvia de Porches, durante o período de férias que, ano após ano, reservava em Outubro –, ao olhar desinteressadamente para o televisor, emocionalmente fui assaltado com a notícia do falecimento do jornalista Rui Tovar, aos 66 anos, vítima de paragem cardíaca. A meu ver, o jornalismo em Portugal não ficou pobre, ficou muito empobrecido, pois julgar que a sua reputação de excelência profissional se deve, apenas, à mestria competente que proporcionou o apogeu do melhor da informação desportiva, narrando explicitamente as transmissões televisivas das empolgantes finais da Taça de Inglaterra (outrora transmitidas no primeiro canal da RTP, nos anos 80), é fazer uma avaliação incompleta e superficial, pois o que mais valorizo são as qualidades de conduta como pessoa. Neste capítulo, o seu modo respeitoso de estar na vida, tratando com dedicação quem se cruzava com ele, leva-me a defini-lo como alguém cuja prosa de vivência era enaltecida por manter o mesmo tom de voz sereno quer em situações de concordância quer discordantes, destacando a reacção elegante – “era um grande escritor” – referência a José Saramago, Nobel de Literatura em 1998, que no decorrer do ano 1975, rudemente correu com o jornalista do Diário de Notícias. Aqui chegados a este reconhecimento, olhemos para o que se passa de terça a Sábado, à hora da Cinderela, na Antena 2.
O substantivo feminino raiz tem as seguintes acepções: órgão das plantas vasculares de fixação e absorção, normalmente subterrâneo; número que, elevado a uma certa potência, produz a quantidade a que esse número se refere; origem; a parte oculta de qualquer coisa; a palavra de que outras se formam; a parte da palavra primitiva em que reside o significado da ideia original. No plural, faz alusão ao programa de rádio que talvez não seja conhecido por muitos amantes de conteúdos radiofónicos. Raízes responde à curiosidade e ao anelo descobridor de dialectos variantes da designada Música do Mundo (World Music), sendo uma agradável rajada de vento sentida no éter da radiodifusão, orientada por Inês Almeida.
Numa das emissões dedicada ao folclore dos antigos territórios do império Austro-Húngaro, resgatei do subconsciente os tempos de infância em que no lar, a música sempre esteve presente, pois o meu pai, não se limitava a ouvir rádio, adquirindo discos. Um dia, surgiu com um registo de músicas regionais portuguesas… Assim, volvidos 31 anos, começou uma aventura, pois no rol da amizade dos Marretas (descritos na crónica DOL(ly)), falando do tal disco, um dos Marretas ofertou-mo, dando por mim a ouvir algo que jamais pensei fazê-lo!
Etiqueta: Rádio Triunfo, Lda.
Referência: RT 10004
Duração: 39:23
«Pelo Toque da Viola» é o segundo álbum de quatro discos do grupo coral e instrumental Terra a Terra, que funcionam como um arquivo que nos faz viajar pela história da música regional portuguesa. Editado em 1981, o LP é um verdadeiro songbook com um a dúzia de recriações de cantigas populares de diferentes regiões (Minho, Trás-Os-Montes, Alto Douro, Beira Alta, Beira Baixa, Baixo Alentejo e Açores). Ao todo são 17 os homens e as mulheres que fizeram parte do grupo na gravação ocorrida entre 25 a 30 de Maio.
Para os seguidores do Culto do Vinil, “escrever sobre uma obra folclórica é algo de doidos, pois as crónicas neste espaço são maioritariamente de rock, seguidas em segundo plano de rock, na terceira posição igualmente o rock e na quarta e seguintes, novamente rock”… Mas evoco este disco por se tratar de um trabalho qualificativo, com maravilhosos arranjos corais e instrumentais assinados por Mário Piçarra (filho do cantor Luís Piçarra), Jaime Ferreira e Ana Faria (mãe de Nélson e Sérgio Rosado, elementos da banda Anjos).
Além do rol interpretativo, deparei-me com algo impensável em registos de folclore… «Pelo Toque da Viola», demonstra o talento de José Fortes, engenheiro de som, que esculpio um disco muito bem gravado, com corpo harmónico e ambiência, focando o espaço de cada instrumento sem entrar na área do outro, assumindo o compromisso de disponibilizar audições sem fadiga e sem véu ocultante da sonoridade de cada um dos instrumentos. Assim, a faixa «Chula Rabela» é um verdadeiro exemplo dessa característica: os instrumentos de cordas (violas, violão, viola braguesa, bandolim e violino) são reproduzidos com limpidez notável, sentindo-se a extensão do instrumento de sopro (pifarinho) e o perfeito brilho do recorte dos ferrinhos deambulando de canal em canal. Na «Gallandum» (cantada em dialecto mirandês) e «Peras e Pão» (cantado por 8 vozes femininas), destaco a textura do bombo e sua consistência harmónica no rufar da pele tensa, cuja sonoridade bem grave é única e distinta do som proveniente da caixa e dos adufes. Finalizo, indicando que a voz de Ana Faria, em «O Rapaz do Casaquito», «Olha o Passarinho!» e «Sete Varas Tem», leva-nos numa comparação à “rainha da música folk” – Joan Baez – pelas semelhanças na genialidade angélica e pureza da voz que, por si só, vale o disco, ofuscando vozes de gerações posteriores…
Naquele início da quarta tarde de Julho, ultimando a narrativa ao sabor da infusão preparada com semente de cafezeiro, servida em chávena de vidro e sem adição de açúcar, no Doce Impakto – café/pastelaria sem vista para o mar, situado na Rua das Quintas, no concelho de Almada, onde a mistura simples da arquitectura decorativa com a ambiência pacata e a simpatia, convidam a colocar a leitura em dia, trazendo à memória um café similar que frequentava na vila algarvia de Porches, durante o período de férias que, ano após ano, reservava em Outubro –, ao olhar desinteressadamente para o televisor, emocionalmente fui assaltado com a notícia do falecimento do jornalista Rui Tovar, aos 66 anos, vítima de paragem cardíaca. A meu ver, o jornalismo em Portugal não ficou pobre, ficou muito empobrecido, pois julgar que a sua reputação de excelência profissional se deve, apenas, à mestria competente que proporcionou o apogeu do melhor da informação desportiva, narrando explicitamente as transmissões televisivas das empolgantes finais da Taça de Inglaterra (outrora transmitidas no primeiro canal da RTP, nos anos 80), é fazer uma avaliação incompleta e superficial, pois o que mais valorizo são as qualidades de conduta como pessoa. Neste capítulo, o seu modo respeitoso de estar na vida, tratando com dedicação quem se cruzava com ele, leva-me a defini-lo como alguém cuja prosa de vivência era enaltecida por manter o mesmo tom de voz sereno quer em situações de concordância quer discordantes, destacando a reacção elegante – “era um grande escritor” – referência a José Saramago, Nobel de Literatura em 1998, que no decorrer do ano 1975, rudemente correu com o jornalista do Diário de Notícias. Aqui chegados a este reconhecimento, olhemos para o que se passa de terça a Sábado, à hora da Cinderela, na Antena 2.
O substantivo feminino raiz tem as seguintes acepções: órgão das plantas vasculares de fixação e absorção, normalmente subterrâneo; número que, elevado a uma certa potência, produz a quantidade a que esse número se refere; origem; a parte oculta de qualquer coisa; a palavra de que outras se formam; a parte da palavra primitiva em que reside o significado da ideia original. No plural, faz alusão ao programa de rádio que talvez não seja conhecido por muitos amantes de conteúdos radiofónicos. Raízes responde à curiosidade e ao anelo descobridor de dialectos variantes da designada Música do Mundo (World Music), sendo uma agradável rajada de vento sentida no éter da radiodifusão, orientada por Inês Almeida.
Numa das emissões dedicada ao folclore dos antigos territórios do império Austro-Húngaro, resgatei do subconsciente os tempos de infância em que no lar, a música sempre esteve presente, pois o meu pai, não se limitava a ouvir rádio, adquirindo discos. Um dia, surgiu com um registo de músicas regionais portuguesas… Assim, volvidos 31 anos, começou uma aventura, pois no rol da amizade dos Marretas (descritos na crónica DOL(ly)), falando do tal disco, um dos Marretas ofertou-mo, dando por mim a ouvir algo que jamais pensei fazê-lo!
Etiqueta: Rádio Triunfo, Lda.
Referência: RT 10004
Duração: 39:23
«Pelo Toque da Viola» é o segundo álbum de quatro discos do grupo coral e instrumental Terra a Terra, que funcionam como um arquivo que nos faz viajar pela história da música regional portuguesa. Editado em 1981, o LP é um verdadeiro songbook com um a dúzia de recriações de cantigas populares de diferentes regiões (Minho, Trás-Os-Montes, Alto Douro, Beira Alta, Beira Baixa, Baixo Alentejo e Açores). Ao todo são 17 os homens e as mulheres que fizeram parte do grupo na gravação ocorrida entre 25 a 30 de Maio.
Para os seguidores do Culto do Vinil, “escrever sobre uma obra folclórica é algo de doidos, pois as crónicas neste espaço são maioritariamente de rock, seguidas em segundo plano de rock, na terceira posição igualmente o rock e na quarta e seguintes, novamente rock”… Mas evoco este disco por se tratar de um trabalho qualificativo, com maravilhosos arranjos corais e instrumentais assinados por Mário Piçarra (filho do cantor Luís Piçarra), Jaime Ferreira e Ana Faria (mãe de Nélson e Sérgio Rosado, elementos da banda Anjos).
Além do rol interpretativo, deparei-me com algo impensável em registos de folclore… «Pelo Toque da Viola», demonstra o talento de José Fortes, engenheiro de som, que esculpio um disco muito bem gravado, com corpo harmónico e ambiência, focando o espaço de cada instrumento sem entrar na área do outro, assumindo o compromisso de disponibilizar audições sem fadiga e sem véu ocultante da sonoridade de cada um dos instrumentos. Assim, a faixa «Chula Rabela» é um verdadeiro exemplo dessa característica: os instrumentos de cordas (violas, violão, viola braguesa, bandolim e violino) são reproduzidos com limpidez notável, sentindo-se a extensão do instrumento de sopro (pifarinho) e o perfeito brilho do recorte dos ferrinhos deambulando de canal em canal. Na «Gallandum» (cantada em dialecto mirandês) e «Peras e Pão» (cantado por 8 vozes femininas), destaco a textura do bombo e sua consistência harmónica no rufar da pele tensa, cuja sonoridade bem grave é única e distinta do som proveniente da caixa e dos adufes. Finalizo, indicando que a voz de Ana Faria, em «O Rapaz do Casaquito», «Olha o Passarinho!» e «Sete Varas Tem», leva-nos numa comparação à “rainha da música folk” – Joan Baez – pelas semelhanças na genialidade angélica e pureza da voz que, por si só, vale o disco, ofuscando vozes de gerações posteriores…
Blá-blá-blá com a antiga grafia: Ghost4u
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