Discos de Vinil - Vinyl Records - Disques Vinyles - Vinyl Schallplatten - Discos de Vinilo - Виниловые пластинки - 黑膠唱片 - Vinyl Monumentis



CHECK THE VINYL CULT NEW PLACE

»»»»» HERE «««««

VISITEM O NOVO ESPAÇO DO CULTO DO VINIL





2014/07/27

Carta Aberta


Carta aberta ao Presidente da República Portuguesa,

Professor Aníbal Cavaco Silva



Excelentíssimo Senhor Presidente da República


Na segunda metade da década de 80 e nos primeiros cinco anos da última década do século XX, assistimos à regência de Vossa Excelência no Governo de Portugal. O relato de um tempo de mudança e de feitos motivados por visões de um especialista em economia, enredadas por teias de interesses, sem se perceber o nível de implicações que teria na economia real, conduziram, decisivamente, ao destino imponderável do actual estado débil de Portugal. Assim, poderia esboçar uma análise aos milhões de euros aplicados diariamente no nosso país, como fundos estruturais da Comunidade Económica Europeia (CEE), que ao invés de fomentar o investimento na saúde, na educação e no desenvolvimento industrial, foram, quais bem-aventuranças, facultados sem regulação, rigor, nem fiscalização, a cidadãos empresários que, esfregando as mãos, adquiriram automóveis com motorização de elevada potência, veículos todo-o-terreno e residências de férias (para eles próprios e não para usufruto dos colaboradores). Nesse tempo de “vacas gordas”, o nome de Vossa Excelência ficou indissociavelmente conectado à plantação de milhares de eucaliptos que seca a terra da nossa floresta e aos subsídios concedidos para a aniquilação dos nossos recursos – agricultura, frota pesqueira e alguns sectores da indústria – os quais, quiçá por proferir a frase “nunca tenho dúvidas e raramente engano-me”, nos seus recentes pensamentos em voz audível, apela para que viremo-nos para a agricultura e para o mar… Poderia elaborar uma reflexão em torno de rodovias construídas, particularmente auto-estradas, que causaram consideráveis derrapagens orçamentais (será que a composição do asfalto utilizado era de dúbia qualidade?)… Poderia dissecar sobre Vossa Excelência ser considerado o primeiro nutricionista que engordou o aparelho do Estado com a criação de “jobs for the boys” do partido que liderou… Poderia enumerar as medidas relacionadas com a privatização da banca, promovendo a cultura consumista mediante a facilidade de obtenção de dinheiro por empréstimo, dando a sensação de um país e um povo “aparentemente” mais rico que, posteriormente, grande parte das famílias e empresas vê-se endividada até à medula… Posso relembrar que a promiscuidade entre o poder político e o poder económico, permitindo que os bancos sejam os efectivos dominadores da economia portuguesa, também se sentiu na governação de Vossa Excelência… Posso ainda citar que o elevado aumento aplicado no valor a pagar de portagem na travessia da Ponte 25 de Abril, levou ao espontâneo movimento de cidadãos (imagine como seria se, no passado, existissem as redes sociais electrónicas), que por realizar um buzinão de bloqueio e de contestação social, sofreu uma despropositada carga policial, vitimando um jovem que ficou tetraplégico devido a um tiro… Posso referir que em 1989, após o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República ter aprovado por unanimidade o parecer de conceder ao Capitão de Abril, Salgueiro Maia, uma pensão por “serviços excepcionais e relevantes prestados ao país”, surpreendentemente, recusou essa concessão. No entanto, numa inexplicável dualidade de critério, em 1992, concedeu a mesma pensão a dois inspectores da polícia repressiva do antigo regime – PIDE/DGS. A propósito de reformas, na qualidade de Chefe de Estado, deixou perplexos os cidadãos com pensões baixíssimas ao afirmar, a 20 de Janeiro de 2012, que “os €13 000,00 de pensões que aufere, quase de certeza que não dariam para pagar as suas despesas”.

É verdade que hoje em dia, as pessoas exigem demasiado da vida… Por pensarem que todos os momentos têm de ser felizes, reivindicam perfeição. Ora, isso só acontece na televisão e nos filmes. Essa não é a realidade humana. Mas cometer o mesmo erro duas vezes?! Recordo que nas suas funções de Primeiro-Ministro, pela voz do Sub-secretário de Estado da Cultura, Sousa Lara, desvalorizou e vetou a candidatura de José Saramago ao Prémio Literário Europeu pela publicação de «O Evangelho Segundo Jesus Cristo». A sua atitude, promoveu o auto-exílio do escritor na ilha de Lanzarote, nas Caraíbas. Depois, em Junho de 2010, no cargo actualmente exercido, estando de férias algures no Arquipélago (português) dos Açores, Vossa Excelência abdicou de deslocar-se a Lisboa para assistir às cerimónias fúnebres do escritor.

Recentemente, no primeiro de Julho, por ocasião do anúncio da atribuição do Lifetime Achievement Grammy a Carlos do Carmo – primeiro artista lusitano a recebê-lo pela carreira de referência no panorama internacional, não só do imaculado dom de cantador e do seu magnificente repertório, mas também do muito que tem feito para a reformulação, renovação e implantação nacional do Fado com a criação do respectivo Museu e com o reconhecimento universal do Fado, classificado pela UNESCO como Património Imaterial da Humanidade – os portugueses não registaram o reconhecimento ou a congratulação institucional do supremo representante da nação. Por muito que Carlos do Carmo seja uma das vozes dissonantes da governação de Vossa Excelência e do seu modus faciendi como Chefe de Estado, a verdade é que foi reeleito em 2011 como Presidente de todos os seus concidadãos. Como tal, permita recordar-lhe que antigamente, o compromisso era algo positivo. Uma pessoa que assumia um compromisso, merecia a admiração do seu semelhante pela lealdade e sobriedade. Agora, verifico que a falta de firmeza e cultura de compromisso levam a evitar o comprometimento, como se a palavra “compromisso” tivesse perdido significado, pois não pretendemos comprometer-nos genuinamente.

Volvidos 22 anos, o episódio repetiu-se. A cultura, elo de expressão e de equilíbrio num povo, certamente não está agradecida por ter tido um Chefe de Governo e um Presidente, que não é capaz de agraciar individualidades galardoadas a nível planetário, apenas, por negarem escusar-se a exposição metódica em contraponto sobre determinado assunto relacionado com os seus mandatos. No entanto, segundo a locução popular “mais vale tarde do que nunca”, como a cerimónia da entrega do Grammy está agendada para 19 de Novembro, em Las Vegas, Vossa Excelência ainda pode felicitar o fadista que tem dignificado o nosso país ao longo de 50 anos de carreira.

Na eventualidade de não conhecer a obra de Carlos do Carmo, recomendo os álbuns «Fado em duas gerações» (1969, Decca), «Um homem na cidade» (1977, Trova), «À noite» (2007, Universal Music) e «Carlos do Carmo & Bernardo Sassetti» (2010, Universal Music), os quais, o seu genro, proprietário da Rádio Amália, certamente terá o prazer de facultar a Vossa Excelência.


  Respeitosamente,

  Ghost4u (utiliza a grafia antiga)

Sem comentários: